Sunday, May 26, 2013

As esquisitices, tristezas e alegrias de ser uma Lolita do interior.

Então... por que você se veste assim?
Esse assunto é comum não apenas quando você é uma lolita, mas quando você usa qualquer estilo diferente do "normal", e é ainda mais frequente no interior (fora das grandes capitais).
Eu nasci e cresci em Angra dos Reis, RJ. É chato ter que explicar sempre que você não está fantasiado de nada, que não faz parte de nenhum grupo de teatro nem de dança, que esse é só seu jeito de se vestir.
Não gosto das roupas "normais". Acho a vida muito curta pra usar roupas chatas. Gosto de me sentir livre pra vestir o que eu gosto, quando eu quero e onde eu quero, então eu apenas faço isso. Não se trata apenas de Lolita, apesar do nome do post incluir.
Alguns dias atrás eu resolvi fazer meu primeiro outfit Pastel Goth pra usar no clube do livro da livraria Nobel aqui de Angra. Não foi nenhuma surpresa os olhares que as pessoas me lançavam na rua, afinal eu estou acostumada, mas fico um pouco chateada com esses olhares pois sei que por causa deles muita gente desiste de usar aquilo que tem vontade... E eu acabo assim: sozinha.
Ah, mas não deve ter só você que usa estilos alternativos de roupa na sua cidade...
E não sou só eu mesmo, eu tenho certeza disso, mas parece algo como procurar cabelo em ovo. As pessoas, quando ousadas demais para os padrões da cidade, pintam os cabelos de um jeito diferente. Nas roupas (que eu acho MUITO mais fácil de fazer até do que cabelo) ninguém ousa. Quando acontece de você ver alguém diferente, é por que já se tornou moda e todo mundo faz exatamente igual. Acredito que deve ter mais gente diferente por aí, mas eu já não procuro mais.
Mas saindo desse assunto, que não é o foco principal...
Depois que a gente se acostuma com os olhares atravessados, a gente começa a ver o lado divertido das coisas: na minha humilde opinião, principalmente das senhoras e das crianças.
Na primeira vez que eu resolvi sair de lolita na minha cidade assumo que estava um pouco acuada. Muita gente ia olhar. Muita gente ia comentar... Mas quando estava no final da minha rua, prestes a dar um grande passo na vida (segundo minha concepção um dos mais importantes pra mim), uma senhora me chamou a atenção e pediu para eu parar. Eu parei. Ela estava com uma amiga, na frente do portão de casa, conversando. Sorriu pra mim. "Você está uma boneca linda, mas deixe eu ajeitar aqui pra você, seu vestidinho ficou preso na barra da anágua."
Eu nem sei explicar o sentimento que me abateu. A outra ainda comentou "Minha mãe se vestia assim quando nova. Os vestidos eram mais compridos, mas você me lembrou como eram bonitos". Eu sorri e agradeci. Tomei toda coragem do mundo e mesmo as brincadeirinhas mais rudes que eu ouvi no caminho para o shopping eu já me esqueci.


Mas, com certeza, melhor do que isso são as crianças. Pra uma criança você não é uma doida vestida de boneca. Pra uma criança você não é um cosplay, um fetiche,... Pra uma criança você é uma princesa, uma fada, uma heroína.
Meu primeiro momento com uma criança foi no trabalho. Eu trabalhava numa boutique e tinha levado um vestido pra que minhas colegas de trabalho vissem. Como a loja estava vazia, elas pediram que eu vestisse. E lá fui eu me montar de lolita no trabalho. Quando saí do provador entrou na loja uma mulher com duas meninas que pareciam ter 4 e 7 anos de idade, por aí. Eu fiquei um pouco envergonhada, afinal, estava em horário de trabalho, mas a mulher não ligou, sorriu e foi dar uma olhada nas araras. Enquanto minha colega de trabalho a atendia eu notei os olhares curiosos e tímidos das meninas. Sorri pra elas sempre.
A moça fez suas compras e antes de sair a menina menor puxou a barra de sua saia e falou algo pra ela. Ela olhou pra mim, sorriu e disse "Então você acha que ela parece uma princesa, Júlia? Sabia que esse é um estilo de se vestir? Pergunte pra ela o nome."
-"Qual o nome?" -ela perguntou com muita vergonha.
-"É Lolita." -respondi.
-"É bonito, você parece uma fada." -foi o comentário dela antes de sair com a mãe que se despediu de nós vendedoras com um aceno.
-"Eu quero ser assim também, mãe." -tive a honra de ouvir a menina mais velha falar isso antes de a porta se fechar.

Sabe. Quando uma criança te elogia você vai nas nuvens. É simples, é pequeno, mas é totalmente sincero. Faz tudo valer a pena. Não tem como não ganhar o dia.

Voltando ao caso do dia em que saí de Pastel Goth. O ônibus que peguei para ir ao shopping estava cheio de senhores e senhoras da terceira idade. Um desses senhores - aparentemente o mais sem noção e desbocado de todos eles - resolveu sentar-se ao meu lado, mesmo que o ônibus tivesse uns 15 assentos vazios ainda. Embora eu estivesse com meus fones de ouvido, consegui escutar a palavra Barbie seguida de risinhos umas 300 vezes antes de chegar no meu ponto. Quando me levantei pra sair ele foi educado e me deu licença, mas não perdeu a chance: "Mas que peça você vai apresentar no shopping a essa hora da manhã toda bonitinha assim, Barbie?"
"Eu não estou fantasiada. É meu estilo, me visto assim normalmente."
"As crianças de hoje em dia estão cada vez mais sem noção." VEJA SÓ!
Saí do ônibus achando realmente que eu não precisava ter um diálogo desses logo de manhã. Não acho problema as pessoas não gostarem das minhas roupas. É problema delas. Mas gostar enquanto acha que é uma fantasia e deixar de gostar - e criticar - por que é uma roupa do dia-a-dia e não uma fantasia é outro assunto. Se fosse uma fantasia? Se eu estivesse usando uma roupa de Barbie Fairytopia ou uma fantasia do Homem-Aranha de que acrescentaria ou não na minha vida um comentário desse, meu senhor? Se antes dissesse "Acho que sua roupa ficaria mais elegante se você não usasse essa coroa de flores" ou "Talvez um scarpin tivesse caído melhor com a sua saia"... Mas uma crítica à juventude por causa de uma roupa -permitam-se dizer- decente. Eu não estava com um top e um shortinho enfiado na bunda, por conta disso minha mãe já fica muito orgulhosa e feliz.

Infelizmente existe muita gente assim. O chato é não ter com quem compartilhar essas experiências: as pessoas ao seu redor não sabem como você se sente, pois não se vestem como você.


MAS EM COMPENSAÇÃO... depois de algum tempo sendo a unica "ativa" dessa área, você começa a se sentir única. Mesmo se você não for. A verdade é essa. E se sentir único é algo mágico. Se acostumar com os olhares estranhos e admirados, se sentir "badass" e saber que está bem na fita.


"Então você é a garota-boneca? Minha prima disse que viu uma garota assim em tal lugar, era você? Nossa você realmente parece uma boneca!" - isso é MUITO divertido.

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